quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Mirabile dictu

Alice tinha nove anos quando aquilo aconteceu. Eu lembro de estar sentado na cama, tinha a recém acordado, a cortina tava meio aberta quando eu espiei pro andar de baixo e vi seu corpo magricela esparramado no jardim. Achei estranho, senti medo. Mas vi que os olhos dela tavam abertos e vez ou outra um riso ameaçava brincar no seu rosto pequenininho. Ela usava um vestido amarelo, da cor do sol que brilhava ainda fraquinho, brigando com as nuvens por um lugar no céu ali do bairro. De um minuto pr'outro, vi Alice agitar o corpo contra o gramado novo, e achei aquilo muito estranho. Me deu medo de novo. Pulei da cama e calcei os chinelos, abrindo a porta e correndo escada abaixo, ouvi mamãe gritar alguma coisa, mas fui mais rápido ao abrir a porta e saltar ao encontro de Alice (que naquela época tinha nove anos...).
Atirei-me ao lado dela e segurei seu ombro, sacudindo-a.
- Alice! O que tá fazendo?
Ela riu - e eu achei aquilo tão divertido, a pesar do medo que eu tava sentindo!
- Vem! - ela segurou meus cotovelos e começou a se mexer, eu dei um pulo pra longe dela. Mamãe apareceu na porta e eu vi nela um olhar estranho, coisa que nunca antes tinha visto.
- Gabriel, tu estás de pijama! Vem já pra dentro. Alice, sua mãe sabe que você está aqui?
Assim que Alice ouviu a voz de mamãe, ela deu um salto do chão. O vestido amarelo-sol agora dividia lugar com um pouco de terra e lutava com o sorriso de Alice, pra ver qual chamava mais atenção.
- Deixa o Gabriel brincar lá em casa, tia.
- Minha querida, vai pra casa - mamãe disse, me puxando pelo braço e se abaixando pra espanar a terra dos meus joelhos.
Alice olhou pra ela com aquele sorriso, e eu não entendi absolutamente nada do que tinha acontecido ali, naquele dia, quando Alice tinha nove anos e eu, vinte e cinco.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Aviamentos

É somente aquela sensação de que o céu está claro e o sol brilhando, e o fulgor do coração contente e relaxado bombeando sobriedade e contentamento pra todo o resto do corpo, que com os passos tortos segue caminhando, uma mochila nas costas - sem muito peso - e a cabeça costurando atrações.
Já não é mais hora de inventar, é hora de tramar as peças: chega de procurar, buscar, pensar, mastigar as palavras encarceradas na cabeça. É hora de pinçar e juntar todas as sílabas, todos os sentimentos, toda a emoção. É hora de pegar tudo e jogar numa mistura, nessa mistura inusitada que é viver com paixão. Saber envolver em abraço quem passa e encanta, saber que sonhar já não é solução. E assim, tenho esclarecimentos, a vida vai jogando pistas no meu caminho sujo, e meus passos tortos já não se enganam. Os lábios sorriem, estimulados pela sobriedade e pelo contentamento; e ao lembrar de ti eu já sou sol garoa e vento e volto sempre a ser o que sou. Entende a magia do caminho? É só seguir, só seguir... E às vezes a gente ainda acha que é demais. Com amor, sempre é demais... Porque o coração que pulsa necessita de motivo pra pulsar cada vez mais. E nessas, de motivo, desejo, confusão, desassossego, a gente tira dele a sobriedade; e o contentamento. Nada que uma boa mão não alinhave.

sábado, 26 de novembro de 2011

Fótons

Então eu vou juntar todos os pedaços de mim que caíram pela estrada, vou juntá-los com todo cuidado e cuidar deles. Vou tratar de reconstruir quem um dia já fui? Ou vou tentar reconstruir todos aqueles sonhos que passaram e se perderam nas curvas sinuosas desse longo caminho? Eu quero voltar a sonhar... Voltar a sonhar como nos dias em que o sol brilhava lá no alto, mas que era fresco, e a gente ria... E havia amor. Porque tudo está tão pragmático, tão estabelecido, tão vai-ser-assim já-estou-vendo. Acho que precisamos juntar os pedaços e reconstruir aquele coração corajoso, ainda que ignorante: não sabia o que queria, não sabia o que fazer, mas era bravio! E assim, me abaixando caminho a fora, apanhando cada pedaço de mim que caiu - que eu amadureci e deixei cair e aqueles que foram arrancados antes do tempo - vou fitar o sol, e pedir baixinho: que sol volte a brilhar de novo, luminoso... alvo e claro mas que, por favor, traga frescor! Que o anoitecer volte a ser lilás, que os sorrisos em nossos rostos voltem a ser de paz. Sem mais desespero, por favor. Talvez, pegar as mãos, eu afundo no ocre, tu mergulhas no ciano... E assim, naquele sorriso bobo, naquelas células que brincam nos lábios e fazem encher os olhos, a gente encontra o encanto. E eu, que continuo juntando os pedaços, quem sabe... Quem sabe eu encontro tuas mãos, me ajudando.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Câmera lenta

E com aquele sorriso do tamanho do mundo ele tentava distrair o coração louco e conter o corpo - que de tanto nervoso pulava de um lado pro outro -, fingindo que tudo estava muito bem e que aquela situação era somente embaraçosa.
Mas por trás daquelas mãos que suavam segurando a própria camisa, um coração ainda mirim batia e ameaçava-lhe arrebentar o peito. O cérebro jovem e cheio de fórmulas e vozes e ilusões tentava esquecer o discurso ensaiado. Mas ela estava ali, bem na sua frente, os cabelos bem ajeitados num coque, o rosto incomum e ao mesmo tempo tão familiar distraído. Aqueles olhos perdidos em algum pensamento que lhe punha medo por detrás do sorriso.
Ele estendeu a mão, agiu com naturalidade. Cumprimentou, ela acordou dos devaneios, deu uma risada e respondeu animada à uma conversa sem compromisso, sem noção, aquela empolgação desnecessária. Ele se pôs a falar, enquanto ela quedava em silêncio, tão ou mais distraída - indiferente? Ele tentou buscar seus olhos, mas nada encontrou. O sorriso enorme foi aos poucos se definhando, ela já ria sozinha, fitando o chão. Ele já agarrava-se a ilusão escondida a pouco dentro do peito.
Eu senti o coração dele, batendo lá, lento. Ela confusa, ela tanto-faz. Eu bebi um gole de conhaque e fiquei a pensar no tudo que se constrói e se destrói em bem menos do que cinco minutos.

domingo, 20 de novembro de 2011

Blow blow blow it up

Cara, meu coração tá batendo... tá batendo cada vez mais forte enquanto eu escuto todas essas vozes gritando, brigando, esbravejando e lutando por poder. Batendo cada vez mais forte, sangrando cada vez mais - e forte! E toda essa gente que por aí grita e grita e nem sabe o que diz. É que sabe, cara, o meu coração dói: toda essa matéria de que eu sou feita - tecidos e artérias e veias - se machuca cada vez que o cérebro assimila o caos, o terror, assimila um possível futuro próximo, raciocina e vê o caminho da humanidade. E sangro, sangro por aqueles que não tem lar e sangro mais por aqueles que o perdem. Eu vejo o chão de terra aos poucos encharcando, eu vejo as árvores que choram pela seca. Eu vejo a natureza que nos deu vida nos levando a morte. E ninguém tá preocupado com isso. E meu corpo, só assim, respondendo: vai com a natureza, coração batendo, batendo... meus olhos ardentes marejando. E o vento lá fora é quente, os passos são rápidos e francamente, eu acho que as cabeças... as cabeças... são vazias.

Não dói em você?

sábado, 19 de novembro de 2011

Metapoema

Eu escrevo pra um fantasma
Que vive e anda e canta
E tão longe de mim, encanta
E assim vai matando o coração meu

Eu escrevo pra um menino,
pra um menino que está em algum lugar trancafiado
Que não tem coragem de ser, menino
– e assim vive num corpo de entusiasmo

Escrevo pra um destino
que eu nem sequer acredito!
E que me persegue... com a lembrança
de um passado louco, o meu presente

Escrevo por uma dor, escrevo por raiva,
escrevo pelo meu gozo e pelo meu tato

Mas escrevo, acima de tudo,
pelo meu amor; pelas palavras
pela memória de que o que é escrito
não se apaga.

domingo, 6 de novembro de 2011

Manifesto

Sabe qual é o problema da humanidade? Os homens já não acreditam mais nas palavras. E crê-las não está na veracidade ou na concordância com o que se é dito, pois antes de dizerem algo, palavras são palavras pela sua função. O mundo não aceita as palavras. Julga-se. Extermina-se. Ninguém sabe mais o real sentido das coisas, tudo hoje é definido pelo dicionário. Não há sentimento, não há possibilidades, não há ideias e teses. Não há mais curiosidade e não há mais corações abertos. O mundo vive seu próprio cárcere. A palavra é usada para coagir, instruir, informar... Quem quer informação? Quem está preocupado em saber o que acontece? Quem precisa de direção quando se tem as próprias pernas e o próprio cérebro e é só você sobre você? Alguma coisa tá errada. Viu? Não! Tudo está errado. E pior do que estar alienado ou preso nesse cárcere, pior do que estar cego, surdo e mudo, pior do que ter sido completamente esvaziado pelo que o mundo se tornou é saber que todo o mundo sabe disso. O cárcere está cegando, mas todo o movimento é evidente até mesmo aos olhos de quem não vê: a reação está próxima. Ninguém pode dizer o quê, não se pode escolher um caminho só. São muitas ideias, muitas lutas, mas ainda, muito silêncio. E muita gente cega, surda e muda atrelada às suas condições. E muita gente que ainda enxerga mas prefere a comodidade, a segurança, porque esconde atrás da face da conquista o eterno medo de seguir adiante. E dentro dessas mazelas tão epidêmicas da nossa sociedade, o que nos resta fazer? Puxar ar pelo pulmão e respirar, seguir em frente? Ver no que tudo vai dar? É esse pensamento, entre tantos, que é o mais destrutivo. É pensando assim que o mundo se encaminha para o abismo, parece tão oculto assim?  Interrogações, interrogações... Porque diante de tanta atrocidade e tanta sujeira solta por aí, já não se sabe mais o que é verdade. A mentira é mais bonita, mais segura, mais protetora, a mentira é só pro bem... E é nisso que todos queremos acreditar. Alguém tem a coragem? Alguém tem a ação? Alguém tem as armas e principalmente... alguém tem coração?

Eu vou esperar uma resposta chegar. Mas não por muito tempo. Até lá...

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

1000 km/mês

Ei, você! Alguma coisa mudou. Tá sentindo essa brisa entrando pelas frestas das janelas? Tá vendo esse sol lindo brilhando e brigando com o vento frio? Tem sentido também a esperança e o calor circundando o coração que volta a bater num ritmo instigante? Já sente o sabor das frutas, dos doces, o cheiro das flores e ouve as músicas que cantam os animais? Eu vou fugir pro campo, se for preciso, só pra sentir isso mais vezes... Tem um milhão de pedaços de concreto me rodeando, mas eles já não me comprimem mais. Dá pra sentir as asas crescendo? Dá pra acreditar que tudo aquilo já passou e não volta mais? Fico na lembrança amarga, recordo as palavras e os sentimentos passados. Mas nada disso me atinge mais. Tem sentido o ar mais leve? Tá vendo que dá pra voar? Vou te contar um segredo: é só abrir os olhos e saber olhar. Cada molécula é um presente, é uma surpresa - entalpia de emoção! -, tudo é só mais um segredo, esperando revelação. A bagagem tá quase pronta, já posso ouvir o barulho do mar. Não importa por quantas ressacas ainda se há de passar... Ei, você! Viu que tá perto? Já já vou te encontrar.

domingo, 30 de outubro de 2011

Pedidos

Eu vou pedir baixinho... eu vou pedir baixinho... eu vou pedir baixinho. Toda hora, quando encontro, eu vou pedir baixinho... Preciso do teu olhar ao encontro do meu, preciso de olhos cúmplices que leiam o que eu guardo tão cerrado na minh'alma, preciso de um sorriso bobo e uma repreensão.
Vou pedir baixinho: vem falar comigo, vem me dar uma desculpa pra eu te sorrir tola, e te dizer todas aquelas coisas que eu te disse uma vez em meias palavras... deixa eu brincar um pouquinho com a tua imaginação, deixa eu brincar com nossas vidas, deixa eu te dirigir nesse filme em que tudo são cenários verídicos e sentimentos reais?
Deixa eu te amar... baixinho? Deixa eu sussurrar o quanto dói a saudade? Deixa eu te dizer o que eu penso sobre você e tudo que você era e deixou de ser? Deixa eu te convencer de que não precisa ser tudo assim? Deixa eu mostrar todo o amor e a dor que há dentro de mim...
Deixa eu tomar teus braços pela primeira vez, deixa com que as palavras saiam sem medo... pela primeira vez. Me deixa sorrir louca, me deixa pedir baixinho... Um encontro cúmplice, meu álibi pra vida perdida, meu escape para as longas horas de ocupação e obrigações tardias. Me deixa confessar meu coração. Cuida dele pra mim? Vou pedir baixinho, vou pedir baixinho... Me deixa te sorrir.

sábado, 1 de outubro de 2011

Muito sente, muito cala

Ninguém mede o quanto se sente. Não foi fácil chegar a essa conclusão, não foi fácil tomar coragem e sentar nessa mesa e apanhar do copo como quem segura uma corda de resgate, não foi fácil e nem era pra ter sido. A estrada é sinuosa, cara, os postes estão todos quebrados... o lixo tá solto na rua, as nuvens enchem o céu, pintam-no numa aquarela cinza de tristeza. E tá todo mundo perdido por aí. Tem muito sangue sendo despejado, a todo instante, o tique-taque do relógio é sangue que corre nas veias, o tempo é compasso ao coração: e às vezes, trai. Momentos de medo, reumatismo que dilacera a carne, isso tudo... já não sei, ninguém mede afinal o quanto se tem. Ninguém sabe o que está por vir... entende? Meu resgate chega ao fim e não há esperança, tenho lutado a todo gole, tenho tentado, a cada tique-taque, a cada vez que a porta da rua abre e uma rajada de vento frio passa, acompanhada de mil lágrimas da aquarela cálida. Fico me perguntando, questionando, o tique-taque se esgotando, sinapses aleatórias, lembranças de um paladar, lembranças... Lembranças que ninguém jamais lembrou. Quando tudo está por se perder, e a corda, aos poucos, vai assim... escorregando. As mãos já suam, o tique-taque descompassa, e eu que imploro em meu silêncio: abre, abre, porta! Te aguardo em todo e qualquer lugar, a qualquer hora.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Botânica

Eu já escrevi minha história
e já escolhi meus personagens
Estou te convidando agora:
em boa hora, vem comigo?
Lá no papel tudo é lindo,
as lágrimas são um mistura
de sacorose, anis e artemisia...
Será que foram elas feitas
pra me deixar ou tirar o juízo?

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Narni

Despertador quebrado, janela fechada, ligação alguma... Sonho confuso, coração batendo, o ventre quente e cabeça cheia. O peito que saudades sente, e você, que já não sei... aonde está? Te procuro tanto e te encontro às vezes... O que eu faço quando a chuva queima? Enlaçar teu corpo e tomar teus lábios o que eu faço agora, o que eu faço enquanto não se acorda? Te espero aqui, para despertar... o coração louco e todo meu lutar que te espero tanto e te quero tanto... E o coração batendo, enquanto as águas quentes pelos olhos correm e a face tomam.

domingo, 26 de junho de 2011

Estação

Não sei, não sei... São essas coisas assim que surgem na gente, que a gente em nenhum momento parou pra pensar ou pra construir. São esses anseios e esses defeitos, cada vez mais gritando no peito por um só motivo... São essas coisas que tiram da gente, que arrancam sem nem pedir.
São essas coisas que acontecem quando a gente deixa que o acaso reja nossa vida, e ela assim vai tomando um rumo desconhecido. A gente parado, rezando, pedindo - meu Deus! preciso encontrar um caminho - a vida seguindo, te deixando pra trás.
Um stop, stop (por favor!) e o melhor de tudo é sentir, que o vento passando, pra trás também vai deixando a dor de ter sido arrancada de ti.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Cartas pro menino grande

Boy, boy, boy...
Sinto tanto a tua falta. Por onde tens andado, por onde caminhas? Cadê tu, menino meu? Depois de tanto tempo ainda me pego lembrando de ti, sentindo tua falta. Todo gosto de café na minha boca me lembra tu. E cadê tu agora pra eu te dizer tudo isso? Às vezes vou pra parada de ônibus, só pra ir pra algum lugar, pra talvez... fugir. Espero te encontrar lá. Espero trocar as antigas palavras bonitas contigo, sempre com todo aquele cuidado e receio. E desejo, quando o ônibus para lugar nenhum chega, te dar um abraço, um beijo no peito. Despedir-se corretamente, e não pra sempre, mas como quem se despede e vai voltar. E então embarco no meu ônibus mágico, Ruby Tuesday nos meus ouvidos, menino meu - que saudade eu senti! - explodindo na cabeça. Te olho uma última vez pela janela capenga, tu tens um sorriso descontraído no rosto, as mãos enterradas nos bolsos. Sai de fininho da parada do ônibus a caminhar. Sorrio sozinha. Nós dois, sem rumo, tentando e tentando nos encontrar.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

A noite que segue o sonho

Sempre alerta, sempre alerta
Sinal vermelho fixo no espelho
Mãos frias e rubras
Suando o medo e a dor do corpo
Lágrimas quentes que pelo rosto caem
Borrando a feição de sorriso belo.

Cachecol apertado ao pescoço
passos rápidos
cheiro bom de gasolina
a fumaça chula do cigarro vagabundo
os passos em frente
já corriam

As pernas transpassando
Marcha sendo trocada
Sinal vermelho,
Farol queimado
Cadê a luz?
Cadê a luz?

O sol se esconde
A madrugada é alva
O silêncio, rude.
Grades fechadas,
Alarmes ligados,
Vento sul.

Motor roncando,
Sinal vermelho
Passos correndo
Olhos fechados
Luz.

terça-feira, 7 de junho de 2011

[Run]believable

Pela primeira vez em toda minha vida, eu tenho que por na minha cabeça que tenho que fazer algo. Que seja o que for, mas algo deve ser feito... Que seja se jogar no ou pular do barco, que seja partir pra não voltar - ou seja ficar pra sempre. Que seja o que for, doa ou fortaleça... algo, alguma coisa tem que ser feita. Sei mais do que ninguém que a cabeça tá cheia, o coração a mil, a veia revolucionária pulsando com sede, o sonho insistente e causando dor de cabeça. Mas alguma coisa, qualquer que seja, tem que ser feita. E me pergunto onde está a mão pra me ajudar. As minhas já não andam mais juntas. Do contrário, cada ideia contrária as afasta, e eu já não consigo realizar nem A, nem B. Mesmo sem acreditar - é claro - em destino, espero que o acaso se faça presente e dê um rumo, porque eu não sei qual, não sei como, nem pra onde... Fugir.

domingo, 5 de junho de 2011

Chaos

Eu teria tanto pra dizer. Quem dera que você soubesse ouvir... quem dera. Tenho pensado todos esses dias na porção de coisas que eu teria pra falar, na porção de coisas que seriam possíveis através de tais palavras. E espero na minha mente pelas tuas respostas que nunca houveram, espero pelo teu interesse e pelo teu envolvimento. E eles não vem. Tu não vens.
E assim se passam os dias: arrastados. Tu reclamas todo tempo, e fica sonhando, e pensando "se...". Eu tentando mudar as coisas, eu falando, eu vivendo e tu aí, desvirtuando tudo com medo de se entregar e se ferir. Quem dera se soubesse ouvir, quem dera se soubesse ler. Quem dera se soubesse agir.
Quem?

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Pelas flores que caíram no asfalto

Tentei, segui teus passos
As folhas do outono ruindo no asfalto
Os carros, distantes
Meus pés exitantes
Seguir você, seguir você...

Fácil dizer, díficil falar
Difícil conter o coração ferido
Difícil impulsionar os passos -
a diferença está no caminho!
Tentei, tentei.

Espero um final, espero um encontro
Um tempo, um desconto
Preciso que haja, ainda, um pouco
Pra lutar, ser. Pra aceitar
e deixar que você
Possa partir.

Tentei, tentei
As flores não crescem no asfalto
Você já não sabe
Mas eu ainda lembro
E ainda sinto,
E eu não entendo!

E é essa a dor no meu peito -
onde terás ido?
Espero, espero.
As flores caíram.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Como uma sinfonia perdida

Eu sou o pesadelo daquela noite de medo
Sou a febre na noite perdida
Sou o banho que lava a agonia
Sou o ralo que leva os sonhos
Sou o pranto, o engano, o recanto
Sou teus olhos vagos que ardiam
Sou o canto e o trote manco
Sou as lágrimas que pela face caiam
Sou o coração louco e insano
que por ti ansioso batia
E a mente culposa e profana
Pela qual, em vão, fugia
Sou o vôo, o refúgio, o encanto
dos dias sonhados nas manhãs tardias
Sou o som das vozes amanhecidas
a alegria das crianças na hora da comida
sou o sonho de viver um dia
o sonho de um sonho ser.
Sou suas mãos enlaçadas em nervosismo
sou os lábios que sussurram "tudo bem"
sou um pouco de bebida e tango
e um pouco de amor também.
Ainda assim, continuo sendo
um sonhador dos tempos passados
Ainda assim continuo vendo
através dos olhos embaçados
E ainda assim, mesmo correndo
Continuo perdido, desolado
E sempre assim
Serei o sonho
Mal sonhado, todo o reino desperdiçado
o coração que se cansou, mas insiste em lutar.

Poesia premiada em 1º lugar no Concurso Literário Municipal de Santa Maria, em 09/11/11.

3x1

E somos bobos ao ponto de pensar que isso nunca vai acontecer com a gente. Claro que não, bem capaz. E hoje aqui estamos nós segurando o peito dolorido que bate por um alguém que chora por ela. Que chora por ela que não está nem aí, que chora por ela que está mais ocupada tentando organizar seus pensamentos insanos, tentando se firmar nos seus méritos, tentando encontrar um motivo pra viver enquanto tu estás ali, entregue, sorrindo, focando os olhos cheios de alegria sob o motivo do teu coração partido e ele não sabe nada a não ser sorrir e te contar coisas banais do dia-a-dia, enquanto tens na verdade os olhos deslocados ao encontro dela. E ela mesma que te faz sorrir, que te faz se encontrar. Ela mesma que te mostrou o caminho, te apontou a saída do labirinto, e ela mesma que o faz com segundas intenções, e ela que só finge, finge, finge, e no fingimento se faz intensa e insubstituível e então desaparece. Como um tufo de pó sob a água da chuva, desaparece, se esvai. E nisso ele a busca, e tu buscas a ela, e perdidos, desolados, se afastam - e por causa dela, não tornam a se encontrar ou sorrir. Nem mesmo contos banais. O fim, nem tu, nem ele... Nenhum saberá.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Ocul(t)ar

Meus olhos precocemente desfoacos pelo tempo te enxergam com dor e lágrima, porque tu estás aí ferido e quieto, sofrendo, sangrando, suando em silêncio todas as tuas aflições. Fazendo longas ligações para a secretária eletrônica, deixando-se vencer por essa confusão louca, e assim eu quase não te enxergo. Os olhos meus somente doem. Poderias chegar mais perto pra eu poder te ver e poder te fazer rir? Que talvez, assim, eu consiga te dar um motivo pra sorrir. Consiga acalmar teu corpo inquieto e teu coração reprimido, e consiga também conter o meu, que bate tão dolorido vendo-te viver ferido, sendo aquilo que tu não és.

Todo. Todo dia. Meu olhar sentiu tua falta.
O que os olhos não vêem, falta ao coração.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Labirinto

Eu gostaria de não me importar, de saber deixar pra trás as inquietudes e seguir em frente fazendo bem para eu mesma, mas simplismente não consigo ser assim tão egoísta. E é esse anseio, esse desespero, essa tristeza sem fim por não poder modificar as coisas, essa loucura sem fim por dizer tudo que vem na cabeça e perder e perder e ser mal-compreendida por tudo isso que fode as coisas. Fode as coisas porque me deixam triste, me deixam decepcionada e dizimada. E eu não sei como sair desse labirito. Onde tudo é dito fácil, simples, onde tudo é justificável e necessário e onde tu, por seres diferente e exigente e querer mais e mais e mais e não querer se preocupar só contigo e querer viver e deixar-se ser liberto e querer ser mudança e ser mudado é completamente ignorado às custas do incontentamento. É subjulgado ao posto do encrenqueiro, daquele que arranja problema em tudo e daquele que não cumpre o que diz, quando eu, na verdade, estou correndo atrás de mais e mais palavras para se fazerem cumpridas e conquistadas. E agora, o que eu faço? Esse labirinto que não termina, esse labirinto de incerteza, revolta, essa prisão encarcerando meu peito, esse coração que já não bate, lateja. Essa imprecisão nos dias que se passam em ilusão. O que faço, o que faço, o que faço... Se as alternativas sem chances são a adaptação ou a autodestruição? A vida por si só é o labirinto. Pegar o carro e fugir? Ou ficar e lutar? Como sairei deste labirinto?

domingo, 10 de abril de 2011

Somente um sonho a mais

Acordo-me de um longo sono que virou sonho, todas aquelas coisas que a gente evita tanto na vida e vagam na nossa mente como fantasmas doces e famintos - famintos de liberdade, de sol, de água - famintos de verões que se passam vazios. E dessa vez, sem poder controlar, o sonho me surpreende com a vitalidade do teu olhar, a veracidade do teu sorriso e o sentimento do teu abraço, e não só você, mas todos nós... É hora de encontrar e reunir todo mundo num sentimento comum, hora de sorrir mais, deixar ser e hora de começar aprender a aceitar. Que não, não. E ao mesmo tempo, correr atrás. Porque tá difícil, sim. Whatever stirs my mortal frame.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Porção de coisas em comum

E eu que nunca gostei de surpresas e sempre estive acostumada a controlar tudo ao meu redor, a ter as coisas como certas ou erradas e conhecer o meu caminho, acabo por me deparar com a maior de todas as entropias do meu sistema: deve ser a época do ano, porque eu me lembro bem... As coisas tão viradas novamente. São um bucado de surpresas surgindo sem permissão, são pequenas coisas agitando meus dias de revolta, agitando meus pensamentos calmos e sensatos e minha ânsia por revolução. São mil e uma coisas novas me tomando posse, enquanto não sei, não sei - não sei se luto pela ideia, pelo amor ou por mim. Ou se reúno todas as possíveis forças e luto por tudo ao mesmo tempo, até a exaustão, até conseguir e poder segurar tua mão e dizer: tô feliz, tô bem, consegui. E mesmo que venha a ser utopia da minha frente, a vontade de simplesmente tentar, com todas as forças, já me instiga. E talvez, se eu te conseguir antes, a revolução seja mais fácil, mais sensitiva, mais clara: seja nossa, e não minha. E duas cabeças potencialmente capazes e confusas e astrológicas se encontrarão num só universo: o nosso.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

1ª do plural

Eu amei
Tu amaste
Ele amou
(&) Nós amamos
(&) Vós amasteis
(&) Eles amam

E a gente segue nesse ritmo, de eu, tu, ele e nós, e vós e eles: que nos dizem pra parar, que nos impedem de lutar, que nos deixam desistir e acabar com a vontade que se tem e com o sentimento que se alimenta a todo, todo tempo. E se tu amaste, eu amei, e se nós amamos, nós podemos. Então, não ligue para eles, deixe que continuem não amando - porque eles não amam, e eles não sabem nada, senão conjugar o verbo amar.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Bilhete pra viagem

Por que a gente tem toda essa necessidade de loucura? Por que eu crio essa fantasia toda em minha mente, quando você só é você e só quer viver e eu sou eu e quero coisas novas, e quero tudo e mais um pouco e quero você que não me quer e só quer viver? Por que eu tenho que criar isso na minha mente e me obrigar a fazer? Quero que tu pense o mesmo que eu, bem egoísta, assim mesmo. Quero que possa te dizer todas essas coisas sem tu ficar me achando louca, sem tu querer se afastar de mim por causa disso... Quero poder te ser sincera e completamente sincera e quero que tu se sinta assim como eu. Quero que tu também sejas, e quero que se deixe ser e viver essa loucura, porque, ah... pode até ser loucura... mas eu te digo, e tu sabe: é muito bom. E é novo. E único. E novidade. E nessa loucura a gente vive teu sonho de juventude pra sempre. Vem, vamos nessa... O trem parte às 11. É nossa necessidade, e sendo isso... É irrevogável.

Selo

No final das contas então, quem sabe os errados sejamos nós... Errados por querer saber, querer entender, querer sentir tudo na frequência máxima. Errados por não aceitar um não, um porque sim... Errados porque querem viver e carregar tudo com si! Errados nós nos tornamos por não sermos como os outros, porque não nos contentarmos com tão pouco? E se ser errado nos torna loucos, então loucos é o que somos! Porque o que é do vôo e das sensações sem toda uma complexidade? O que é dos obstáculos sem uma dificuldade? Queremos ver e não conseguimos! Queremos que nos expliquem e vivam e não o fazem. E queremos respirar com atenção, como se aquilo fosse - e é - a coisa mais incomum que existe na Terra. Queríamos, queríamos muitas coisas. E não conseguimos alcançá-las, mas a vontade de fazê-la nos torna incansáveis, incessáveis, desassossegados no desejo de vencer e adquirir. De conquistar um espaço só pra si... De se deixar ser tudo que se pode tornar.

terça-feira, 22 de março de 2011

Incinerando

Eu olho pela janela e tudo que eu vejo é cidade. Cidade. Cidade. Luz. Farol. Nenhum pôr-do-sol, nenhum coração batendo... só eu, o meu - e nós e a cidade. E aquele vazio só se enche enquanto eu busco e olho, e peço: cidade! Por favor, um coração que seja, um sorriso ou lágrima que seja... qualquer sinal de humanidade. Sem carros. Sem luzes. Sem muros ou cruzes. Só eu e o que há de ser vivo ainda nessa nossa realidade. Eu e o que me resta de esperança e paixão e sentimento - eu e tudo. Eu e um coração que deve - tem que - estar perdido por aí, em meio a cidade, embaixo da roda de um carro, nos braços de uma máquina, incinerando pela chaminé de uma destas fábricas, perdendo sua essência pra enxurradas trágicas. Cidade, cidade. Pedir-te sumiço seria muita audácia da minha parte? Nem faça isso, só te peço uma mísera coisa perante tua ganância. Uma coisa insignificante pra ti, então: um só coração. Um que seja. Unzinho só. A escuridão, então, deveras falta. E isso é só sobre essas duas bombas cardíacas separadas por uma construção.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Novo

Eu me sinto nova, novamente. Me sinto sendo essa pessoa que eu não era e que eu tenho gostado de ser. Essa pessoa que a mudança me tornou é real, vital. Me pôs um gás a mais. E graças a toda essa novidade eu pude te achar. No meio de todos esses outros rostos comuns me pus a te observar. E me detenho na sua expressão. Como me parece calmo, sereno, tranquilo e todos esses derivados mais. Como me parece estar solvendo o mundo em sua volta no mesmo tempo em que tem o seu mundo pra construir. E sua tranquilidade me encanta. A forma como tu olha pras pessoas, como quem espera mas também como quem crê. E isso tudo me faz acreditar em você. Boa novidade você na minha vida. Espero não esquecer. E agora, enquanto termino essas frases soltas, observo quando sorri: balanças as pernas e morde os lábios - e isso me deixa feliz.

Suspiro

Eu vou te abraçar bem forte
e te dizer baixinho: meteoro meu.
E então tudo aquilo que deveria ter sido, será.
E você vai pegar meus olhos num lance
e dirá: "tu é minha, guria". E assim será.
E a gente vai improvisar um tango
Na Visconde, na Valandro, na Pinheiro...
Aonde que quer que a gente vá parar.
E finalmente eu ouvirei o teu canto,
e então eu saberei que aí sim é pra ficar.
E a gente vai correr atrás um do outro
e da história e do tempo que se foi
Pra sermos jovens doidos insanos
Pra sermos ciganos desse louco amor...
E um só suspiro então bastará.

Sobre o grilo que morava comigo

Foi inesperado. Eu tava ali entrando no banheiro e o grilo ali me olhando, quase que eu podia vê-lo sorrir. Mas percebi desde o princípio que ele tava triste, que aquilo tudo ali não era pra ser feliz. Deixei-o quieto. Quando a gente tá assim, ou quer um abraço ou quer o silêncio. E já que nossas diferenças biológicas nos privavam dessa expressão de sentimentos, dei-lhe o silêncio e a liberdade de deixar-se estar ali. Até nadou, o pobrezinho. Escalou o tapete emborrachado. Escorado num cantinho, lutou com pra chegar mais alto e fugir da correnteza, mas acabou desistindo. Deixei-o lá, a maresia cessou. No outro dia, achei que já tivesse partido, mas me surpreendi ao vê-lo ali novamente. O pobrezinho nadou mais que nunca - e ele não queria ajuda, só queria viver. E como viveu, o grilo. Um dia e algumas horas no meu banheiro. E soube como.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Eu dei minha palavra

Eu vou te dar duas palavras e esperar tua reação. Deixo bem claro: quero um sorriso, um piscar de olhos, uma sensação. Quero sentir no teu riso aquele quê irônico, aquela vontade que tu tem de dizer as coisas e não diz só porque prefere o silêncio, só porque acha que precisa um pouco de paz. Aí eu vou te olhar no fundo dos olhos e sorrir, e eu espero que tu entendas que o que eu tô querendo dizer, o que eu tô querendo fazer tu sentir é amor. Amor por aquelas pequenas coisas e aquela aura lilás e brilhante que nos rodeava e toda aquela sensação breve e ainda assim terna e eterna. Aí vou abrir minha boca pra deixar que as palavras voem, pra deixar com que elas cheguem bem devagar aos teus ouvidos, pra fazer com que tu sorria o tempo todo enquanto eu digo: mas e aí? E aí que essas duas palavras foram unidas pra acabar com qualquer conversa que fosse. Mas eu tava errada mais uma vez. Tu irias rir e perguntar se tava tudo bem, como tava o colégio, os estudos, aquelas coisas que todo mundo acha que é obrigado perguntar. Que todo mundo julga ser o teu mundo e quem tu és. Mas aí tu foi lá e me mostrou o motivo de ser alguém tão especial, tu pegaste as palavras que eu te dei e me devolveste um eu também. Aí eu te olho séria, vendo que tu sorri, que tu dissipa aquele ar furtivo e agitado e insano e enlouquecedor e que tá louco pra rir da minha cara, tá louco pra jogar aquilo tudo em mim e me fazer pensar que sou uma tola criança. Mas aí eu abro um sorriso de volta, e é a vez de tu ficar sério, e tudo se sucede assim. Uma porção de coisas inesperadas e a gente se entendendo naquela alegria-tristeza sem fim.

Eu gostaria de tê-lo feito sorrir mais

E não adianta... por mais feliz que eu esteja ou por melhor que as coisas andem, quando eu me lembro de ti tudo pede um stop pra sentir saudade. E sentir vontade. Das tardes, das falas, dos risos, dos silêncios incompreendidos e dos cuidados excessivos que a gente teve durante todo aquele tempo - que agora passou e que a gente não tem mais e que só o que se consegue é sentir saudade. Queria pegar o celular e poder enviar aquela mensagem que nunca foi "You. never. realize. how. MUCH. I. need. you.", queria te ligar e te convidar prum café astronômico, queria marcar uma noite com estrelas, bebida e literatura. E queria poder te dizer tudo aquilo que não foi dito, e que tá aqui guardado a sete chaves, machucando, sentindo toda essa saudade: tu é incrível e de todas as pessoas que eu conheci, tu foi a que mais surpreendeu e mexeu comigo. Tu foi a maior amizade que eu já tive, a mais bela afetividade... E tudo isso mesmo com aquela distância e aqueles sorrisos cautelosos. Queria te pedir agora um motivo: um motivo bem forte e insano pra largar tudo e bater na tua porta feito uma louca, pra te dizer oi, tenho pensado em ti e derramar as palavras que eu tanto quero dizer. Para admitir que viver seria ainda melhor com você.

sábado, 5 de março de 2011

Virada realidade

E todo esse clima me deixa querendo te puxar pra perto, pegar um ônibus e ir atrás de ti, te surpreender com palavras bonitas e citações de Howl e de Kerouac e até mesmo de alguma porcaria que por ventura eu tenha escrito, e quero tanto te trazer pra perto e poder despejar minhas palavras delinquentes sobre teus ouvidos, quero tanto poder ouvir tua opinião e teus argumentos. A gente pode estender uma toalhinha na grama, puxar uma bebida qualquer - só pra ter desculpa, só por um pretexto - só pra se deixar falar tudo que se quer. Sabe? Daí nós olharíamos as estrelas e chegaríamos a conclusão de que somos realmente muito estranhos, e que esse mundo não é o nosso mundo e que tá tudo errado, virado, gozado. Que nada tá como deveria ser. Aí tu vais me olhar com aqueles olhos vazios, com aquele sorriso que nada me diz, e eu vou ter que chorar ao me decepcionar mais uma vez! Aí vou te que rir de mim e rir de ti e rir da besteira que a gente faz compartilhando esses pensamentos confusos, deixando-se levar por meias palavras e coisas que a gente sabe que acontecem e finge não saber. Aí um dia a gente vai se separar, vai brigar, vai ficar com nojo um do outro, e no outro eu vou querer, novamente, te trazer, e você vai querer vir que eu bem sei. Só pra repetir a nossa insistência de que as coisas não deveriam ser como são. Mas é.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Random III

É que eu nem sei a quem eu culpo
Se culpo a mim ou ao oculto
Mas realmente amo, amo, amo
E não consigo, não, e sigo...
A tentar me desprender desse refúgio
Permanecer nas coisas,
Deixar viver exclusivamente
E erroneamente o meu prelúdio

Aí te olho
Aí te vejo
Aí te escuto
Aí te beijo

Aí só me dá vontade de sorrir
De despejar
As palavras que insistem e ficam e ficam e ficam no ar
E minha cabeça, não, não, não
Não consegue se aguentar!
Porque te quis, e assim te fiz,
E assim te quero aproveitar.
E olha só,
são as palavras,
são só elas e somente elas
as grandes culpadas.

Mais um nó

E de repente eu me pego descobrindo coisas sobre mim mesma que são total e completamente o oposto daquilo que eu julgava conhecer. Me pego sendo totalmente ciumenta em relação a coisas banais, me pego sentindo insegura em relação a um sentimento que também se manifesta dessa forma perante meu coração. E aí, de repente, estando certa e auto-confiante e determinada e não ligando para nada mais que não fosse a minha própria limpa consciência, me deparo com você, e sinto todas essas coisas que não são costumes, que não comuns. E eu não gosto disso. Não gosto de me sentir vulnerável, de me sentir egoísta ao ponto de querer que só você e você venha correr atrás de mim, venha falar comigo e me deixar feliz. E fico imaginando se você também se sente assim, porque nas raras vezes que eu me esforcei pra demonstrar, você fez completa questão de ignorar. E nessas trocas mudas e discretas, nós continuamos na roda gigante dessa (coisa) toda chamada vida. As nossas vidas. Dois caminhos que se encontraram e parecem ter necessidade de realizar e descobrir coisas, de continuar a vida juntos! Mas desse jeito, olha... Tá difícil. Será que você pode se abrir como eu estou me abrindo? E quem sabe, numa dessas trocas, numa dessas horas inesperadas e nesses pensamentos telepaticamente trocados... A gente se encontre e se decida.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Colora minha vida...

Tua visita sempre é uma surpresa. Não uma surpresa do tipo inesperada, mas uma surpresa do tipo presente, do tipo boa. Fico olhando pra ti e me pego sorrindo sem motivo aparente, mas a verdade é que, meu amigo, eu me lembro dos tempos e me lembro dos gestos... e das palavras e das canções sussurradas e eu sinto falta, sinto muita falta de tudo e sorrio ao poder lembrar. Vejo o quanto mudaste, o quanto nossa própria amizade mudou, e às vezes meu coração egoísta quer te pegar pelo colarinho e fazer tu se dar conta que não, não está legal do jeito que está. Deveria ser como era antes. E que antes nós éramos muito mais, nós éramos heróis, éramos únicos numa terra de figurinhas repetidas. E não quero te deixar cair na mesmice, e sei que não cairás, mas te quero mais aqui do que lá, entende? Então volta a ser um pouco como tu era antes, volta a ser um velho louco mas volta a ser quem tu eras. Tua natureza é incrível e tu sabe. Deixa a falsidade de lado e vive quem tu és. Encantarás mais, sorrirás mais... Mesmo que seja entre meias lágrimas.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Fábula - O Crocodilo ?nterrogativo

Era uma tarde chuvosa na Floresta Mágica. A água caía torrencialmente do céu escuro, lampejado apenas por raios e trovões assustadores.

O pequeno sapo coaxava pulando em direção de abrigo. Ele precisava voltar para o seu lugar. Entretanto, o caminho mais acessível que seria pulando sobre as pedras do rio, era demasiada e assustadoramente perigoso.

Ele sabia que era exatamente quando o tempo assim estava que o crocodilo mais sentia prazer em se divertir, na sua forma mais mórbida de diversão.

Os olhos grandes e amarelos espreitavam-se sobre a água, atentos a qualquer movimento que pudesse vir a ocorrer sobre as pedras do rio num dia como aquele.

O sapo não sabia o que fazer. “Oh, meu deus” – era o que pensava, somente pela visão imaginária dos olhos terrivelmente amarelos perto dos seus. Ele sabia que cruzar o caminho por aquelas pedras não resultaria em boa coisa, era claro que não daria. Resolveu então apenas se esconder por debaixo das folhas úmidas, esperando que aquela terrível chuva cessasse.

Ali foi onde ele adormeceu e passou a noite. Ao acordar no dia seguinte, quando o sol já quase nascia, observou que não mais chovia. Saiu por de baixo das folhas e avançou em direção do rio, logo vendo que o crocodilo dormia.

Tão logo que o sapo cruzou o caminho de pedras e chegou à outra margem do rio, os olhos amarelos escancararam-se, totalmente acordados.

A verdade, e isso era uma segredo que somente o crocodilo sabia, era que ele não houvera ainda dormido naquela manhã.

Em silêncio e imóvel, ele permaneceu durante boa parte do tempo. Porém, dentro tantos outros momentos que fingira estar dormindo, muitos animais cruzaram o caminho, ilesos e satisfeitos com a façanha.

Ora passara por ali também uma pompa garbosa, rindo-se do crocodilo adormecido. Instantes depois, os olhos abriram-se para revelar um amarelo atento, e não tardou até que a pomba encontrasse-se aos dentes do crocodilo.

Durante os dias ensolarados que se passaram, o sapo não voltou a cruzar no local. O crocodilo, cansado de sua imobilidade, resolveu cruzar o lago por um momento, voltando a ficar imóvel em outro local.

Os olhos ainda espreitavam-se em direção a sua localização anterior, quando voltou a chover, o sapo surgiu às margens do rio outra vez.

- Olá, seu sapo – disse o crocodilo muito pomposo.

O sapo retraiu o pulo, paralisou. Girou as patas traseiras em direção ao crocodilo, encarando os olhos assustadoramente serenos e amarelos.

- Como é que te atreves a usar de minha carapuça para cruzar este ímpeto rio?
- Me desculpe, seu crocodilo. Não havia percebido sua recente mudança, nunca foi minha intenção encomodá-lo.
- Ora, não se preocupe, contanto... O único que peço-te é que me responda a pergunta.
- Pergunte, pois, seu crocodilo...
- Como é que te atreves a usar de minha carapuça para cruzar este ímpeto riu? – repetiu o crocodilo calmamente, com o olhar displiscente sobre o pequeno sapo paralizado.
- Me desculpe, seu crocodilo, já lhe disse que o senhor não havia visto.
- Isso sim me respondeste, mas não à minha pergunta. Deixe-me analisar-te, ó, esperto sapo.
- Observo-te há tempos. Tantos e tantos animais por este caminho cruzaram e nenhum deles percebe que sobre a superfície que pisam para fugir da correnteza perene, está um tolo crocodilo adormecido. No entanto o senhor, seu sapo, sempre pula majestosamente minha carapuça. O que realmente me pergunto é: será que o senhor pula minha superfície por medo ou por respeito? Dos poucos outros animais que isso fazem, já me confessaram ser por medo. Mas seu sapo, vou compartilhar-lhe algo... medo de quê? Se eu nada faço além de descansar meus incansáveis olhos e observar as águas ternas?
- Ó, seu crocodilo, desculpe-me interrompê-lo, mas você abocanha muitos dos animais que por aqui passam.
- Mas companheiro sapo, veja só! Não faço isso por maldade, mas sim porque vejo quem e como pisam em minha carapuça. São tantas as coisas que você percebe de olhos fechados, amigo sapo, que você nem tem noção do quanto!

O crocodilo ziguezagueou o rio em torno da pedra onde o sapo encontrava-se, voltando a falar:

- Então, me diga, seu sapo. Diga-me por favor... Medo ou respeito?
- Ó, não quero ser presunçoso, seu crocodilo...
- O senhor está com medo agora?
- Sim, senhor crocodilo. Eu estou.
- Pois sabe o que penso, seu sapo? Que me notava, sim, com respeito pois hoje cometeu, por pura infelicidade, o erro de pisar-me distraidamente, e não ficaste a procurar-me com medo de ser atacado. Pisar-me foi uma fatalidade e eu compreendo isso.
- Compreende, senhor?
- É claro que sim.

O crocodilo sorriu mostrando os afiados dentes e abocanhou o sapo de uma só vez.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Human Presence

Há prazeres que não se encontram em nenhum outro lugar.

Triste é saber que não há olhos suficientes para se analisar, não há almas suficientes para se viver e para se sorrir. Não sei se isso é um pretexto meu, mas ao menos eu sinto. E sorrio. E vivo.

E, se as coisas evoluírem do ritmo que eu suponho, e não atropelaram-me como da última vez, creio que breve as coisas chegarão aonde devem chegar.

E cada vez, só tenho que ser mais leve, mais leve. Mais leve.

Ainda que isso pareça impossível.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

You say ciao, and I...

- Oi.
- Oi!
- Vem aqui - pausa - Posso te dizer uma coisa?
- Hum. Tá.
- Teu sorriso é tão bonito.
- É? - e ela sorri.
- E teus olhos são tão bonitos.
- São? - ela encara os olhos dele esperançosa.
- E eu gosto tanto de você, que até dói.

E daquela forma, com um sorriso nos lábios, e os olhos fixos nos dele, ela permanece, enquanto ele ri, desconfortável, se afastando.

- E você continua deslumbrada depois de eu ter dito o que eu disse?
- Oi?
- Tchau.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Antes que chegue o...

Eu deveria ter imaginado. Ou visto, ou tentado. Ao menos tentato sentir, um pouco que fosse de ódio, um pouco que fosse de desprezo. Um pouco que fosse de dor, para que eu pudese, ao menos daquela vez ter fugido. Antes que fosse tarde de mais, antes que fosse o fim...

(Fim)

sábado, 8 de janeiro de 2011

Sobre uma memória esquecida

Era uma manhã pequenina, uma manhã daquelas de inverno bem gelado. Uma daquelas que não te dá ânimo pra sair da cama, de jeito nenhum, não senhora. Ainda assim eu saí, pulei da bendita e vesti os casacos com os olhos ardendo. Caminhei alguns minutos a pé em direção da escola, desisti. Observei os banquinhos da praça vazios, as árvores alvoroçando com o gelado vento e resolvi me sentar. Fazer companhia às pobres e solitárias árvores.

Comecei a assoviar uma canção. Não me lembro muito bem da letra, mas com certeza falava de amor. Eu gostava do ritmo. Gostaria de cantá-la, se lembrasse da letra. Mas não lembrava. Já não lembrava de nada.

Aproximaram-se da escola alguns colegas meus, até quis acompanhá-los, até quis saudar-lhes com um bom-dia, mesmo que não quisessem me ouvir. Mas não lembrava, não lembrava de como falar com eles, não lembrava de como dar tal bom-dia. Aí, do nada, sentou-se do meu lado uma garota, conhecida minha, e ficou em silêncio.

E eu não lembrava de como era a voz dela. Aí percebi que tudo estava silencioso demais. Ela mexia os lábios com um sorriso grande, brincava com o cabelo enquanto parecia falar, falar e falar. Mas eu nada ouvia. Só via, e via. E nada ouvia.

Havia esquecido de ouvir? Mas então ela pousou a mão no meu joelho, e ainda assim tendo esquecido, senti seu toque e me sobressaltei. Era tudo muito novo. Tudo muito solitário e muito sozinho, e mesmo assim aquela criatura tão admirável continuava a falar, falar, sorrir, sorrir. E eu me quedei no meu silêncio, não lembrando de nada, não conseguindo lembrar sequer com grande esforço.

E aí eu acordei. Não havia nada para ser lembrado.